Foi assistindo à segunda temporada de Girls (HBO), em meados de 2012, que lembro-me de ter tido o primeiro contato com Donald Glover. Sua pequena participação na série de Lena Dunham pode não ter sido tão marcante, mas cada diálogo fez jus a tudo aquilo que o artista tão versátil representa atualmente.
Suas críticas em (e a) diferentes meios artísticos dos quais faz parte – cinema, televisão e música – atingiram o ápice de seu sucesso até então, quando o videoclipe de This Is America, sob a alcunha de Childish Gambino, foi lançado no YouTube no início deste mês.
(This Is America):
(Fonte: Donald Glover / YouTube)
A partir daí, uma enxurrada de análises e possíveis interpretações do clipe varreu a internet de cima a baixo. Os simbolismos de This Is America pesam na consciência por suas críticas afiadíssimas ao racismo nos Estados Unidos da América. Enquanto uma figura irônica e estereotipada dança em primeiro plano (interpretada pelo próprio Glover), as cenas de violência escondidas sob o entretenimento estadunidense chocam pelo realismo artístico.
Ao mesmo tempo em que adolescentes se movem de modo coreografado, seus movimentos lembram, um tanto, reações a uma guerra civil – e nem tão silenciosa –; o que nos é bastante familiar, afinal de contas; considerando que o Brasil apresenta dados quanto à polícia que mais mata ser também a que mais morre. Segundo uma pesquisa do ano passado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 76% das vítimas de intervenções policiais são negras, e 82% têm entre 12 e 29 anos.
Pensando nessa familiaridade entre ambos os países, é muito fácil nos identificarmos com outro trabalho de Donald Glover – o qual assina com seu próprio nome. Atlanta, série de televisão exibida originalmente pelo canal FX, está para Glover assim como Girls esteve para Lena Dunham. Afinal, em cada uma, os artistas polivalentes atuam como criadores, roteiristas, diretores e protagonistas.
(Trailer da segunda temporada de Atlanta; primeira temporada disponível na Netflix Brasil):
(Fonte: TV Promos / YouTube)
No entanto, enquanto que Girls retratou o cotidiano de quatro jovens empoderadas e brancas do Brooklyn (em Nova Iorque), Atlanta mostra os contratempos da juventude negra e marginalizada na capital da Geórgia (também nos EUA). Por sua obra, o artista faturou dois prêmios Emmy em 2017, de Melhor Ator e Direção em Série de Comédia. Aliás, condecoração é algo que Donald tem adquirido cada vez mais no meio comercial, já que ele também levou o Grammy deste ano de Melhor Performance Tradicional de R&B, por Redbone – canção que faz parte da abertura do aclamado thriller sobre racismo Corra!, de Jordan Peele.
Glover estreou, em seu primeiro papel de relevância, na série Community, da NBC. Antes disso, havia escrito e atuado em 30 Rock. Já em 2015, dublou a voz do personagem Miles Morales, a versão negra do Homem-Aranha, em Ultimate Spider-Man. Daí em diante, suas escolhas no cinema e televisão trouxeram-lhe um reconhecimento progressivo.
Seu rosto e talento inconfundível, propenso à veia cômica, podem ser vistos em Perdido em Marte, Homem-Aranha: De Volta ao Lar (em mais uma pequena, mas relevante participação), no atual Solo: Uma História Star Wars (como Lando Calrissian) e, futuramente, no live-action da Disney de O Rei Leão (apenas como a voz do protagonista Simba).
(Áudio de Redbone):
(Fonte: Donald Glover / YouTube)
Seus três álbuns de estúdio já lançados (Camp, Because the Internet e Awaken, My Love!), como Childish Gambino, exploram todos ritmos diversos, como o já citado R&B e o popular rap. Assim, a aclamação de todos os lados da crítica justifica-se imensamente com a capacidade inventiva e bem-sucedida de Glover.
Desde meu primeiro contato com o artista de várias facetas, até sua inevitável repercussão mundial, seja como Donald Glover ou Childish Gambino, minha admiração cresce cada vez mais. O ativismo do escritor, comediante, diretor, músico, DJ, e tantas outras coisas, é algo que vale a pena de se gastar um tempo avaliando. E, pelo menos por enquanto, mantemos a validação do workaholic mais talentoso da atualidade totalmente em alta.
(Trailer de Solo: Uma História Star Wars):
(Fonte: Star Wars / YouTube)
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