Tito é um garoto de 10 anos que vive apenas com a mãe. Quando uma epidemia de medo começa a adoecer as pessoas, Tito embarca em uma aventura com os amigos para tentar encontrar a cura, que parece estar relacionada às pesquisas realizadas por seu pai sobre canções de pássaros .
Essa é a sinopse de Tito e os Pássaros, animação brasileira dirigida por Gustavo Steinberg, Gabriel Bitar e André Catoto, vencedora do Anima Mundi 2018 como Melhor Longa Infantil e pré-selecionada para o Oscar 2019 de Melhor Animação.
O filme, que já passou por diversos festivais internacionais e tem estreia em circuito comercial prevista para 14 de fevereiro, conta com Denise Fraga, Mateus Solano e Matheus Nachtergaele no time de dubladores. Sua trilha sonora foi realizada pelo mesmo estúdio responsável pela trilha de O Menino e Mundo, e a animação, fortemente inspirada pelo movimento expressionista, foi feita a partir de três técnicas: pintura manual, desenhos manuais e animação gráfica.
Além do longa-metragem, Tito e os Pássaros se transformou em jogo online educativo. Nele, as crianças são convidadas a desvendarem comportamentos “esquisitos” nas redes sociais.
Nesta entrevista exclusiva, o diretor Gustavo Steinberg nos dá mais detalhes sobre o vasto e encantador universo de Tito e os Pássaros. Acompanhe:
Francamente, querida!: Por que fazer uma animação infantil sobre uma epidemia de medo? Qual a missão de Tito e os Pássaros?
Gustavo Steinberg: Pra mim, a missão de qualquer filme é divertir e fazer sentir, refletir, pensar. Qualquer filme bom pra mim é assim. Espero que Tito seja um filme bom. Existe uma proposta de fundo que é a de criar o espaço para uma conversa entre adultos e crianças sobre esse novo medo trazido pela mídia, pelas redes sociais e sobre os caminhos para superá-lo. Nós adultos muitas vezes temos uma dificuldade muito grande de conversar com as crianças sobre temas sociais complexos. É difícil mesmo. Dá até um pouco de vergonha como adulto de assumir o nível de loucura que nós estamos criando como sociedade. Mas nós temos que conversar! A gente cria a maior confusão no mundo e – muito em breve – essa confusão vai cair no colo das crianças sem a gente nem ter conversado com elas direito. E as crianças sacam que tá rolando, mesmo que a gente não fale, o que acaba gerando mais angústia. A gente passou 8 anos quebrando a cabeça pra criar uma forma instigante e divertida de abrir essa discussão. Então levem seus filhos! E conversem! Provavelmente eles vão puxar o assunto, não se preocupem. Pelo menos é isso que tenho ouvido de quem assiste ao filme nos festivais – porque o filme ainda não foi lançado. Mas foram muitos festivais, mais de 50 até agora. E já temos mais convites até julho de 2019.
FQ: Como você enxerga o mercado de animações brasileiras infantis atualmente? Produções como “Tito” costumam chegar às crianças? Como você vê a questão da produção e da distribuição quando o assunto é público infantil no Brasil?
GS: Não existe um mercado de animações infantis brasileiras. São muito poucas ainda. Então é difícil de julgar. Está crescendo o número de produções, mas a dificuldade de chegar ao público é grande, independentemente de ser infantil ou não. Pessoalmente, acho que nos concentramos muito nos últimos anos em mecanismos de financiamento à produção – o que é importante – e menos em mecanismos de incentivos à exibição de conteúdos nacionais. Na produção, existe simpatia e reconhecimento em relação à animação por parte das estruturas de investimento, mas essa simpatia não se traduziu em mecanismos efetivos de investimento específicos para animação. Proporcionalmente aos resultados, o investimento em animação ainda é minúsculo. Mas mais do que dificuldades, a grande questão que se coloca agora é da continuidade dos modelos de investimento. Há muitas melhorias a serem feitas, mas deve haver um compromisso de continuidade do investimento. E também da política de cotas. Com o crescimento exponencial da importância dos serviços de streaming de filmes e séries, se não houver cotas como as que foram criadas para a TV a cabo, voltaremos a estaca zero. É simples assim. Se não tiver cota de conteúdo, não existe produção independente nacional sustentada, porque o domínio sobre a distribuição por parte dos grandes players internacionais só cresce com as novas tecnologias, ao contrário do que muitas vezes se pensa.
“Somos uma produção super independente competindo com um mercado de gigantes (Disney, Pixar etc), então precisamos compensar a falta completa de recursos com ideias diferenciadas”.
FQ: O filme deu origem a um jogo online voltado também ao público infantil. Você acha importante abrir canais multiplataformas de comunicação com esse público? Como isso funciona na prática? Vocês já receberam feedbacks sobre o jogo?
GS: O desenvolvimento do jogo tem três objetivos: 1. complementar a história do filme com um elemento que está presente, mas não de forma muito clara (a relação entre redes sociais e medo), 2. Falar sobre um assunto fundamental (no caso, ensinar crianças sobre o funcionamento das fake news, das hate messages e outros problemas do mundo online) e 3. Criar uma forma diferenciada de chamar a atenção do público para o filme. Somos uma produção super independente competindo com um mercado de gigantes (Disney, Pixar etc), então precisamos compensar a falta completa de recursos com ideias diferenciadas. A resposta do jogo tem sido muito boa. O jogo oferece material complementar para pais e professores discutirem os problemas apontados e sei que algumas escolas já o estão utilizando em sala de aula.
FQ: Esse jogo está disponível no site oficial. Já existe também uma estratégia de distribuição para o longa-metragem? Tem data prevista de estreia em circuito comercial?
GS: Sim, o jogo é gratuito e está disponível em titoeospassaros.com.br/game. Ele faz parte de um conjunto de materiais que desenvolvemos para tentar chegar com o filme e seus temas o mais longe possível. Temos um mini-documentário feito com crianças falando sobre o medo deles e dos adultos (a ser lançado em breve na internet), um conjunto de 20 e poucos teasers de 30 segundos para a internet com crianças e o elenco principal do filme falando sobre o medo e sobre questões ligadas ao filme, making of e, é claro, o trailer. Ah, e acabamos de ganhar um edital para um jogo maior, que ainda vai demorar um tempo pra ser desenvolvido. O filme vai ser lançado nos Estados Unidos a partir do final de janeiro. No Brasil, ele deve estrear dia 14 de fevereiro.
FQ: De que forma vencer o prêmio de Melhor Longa Infantil no Anima Mundi 2018 e ser pré-selecionado ao Oscar 2019 de Melhor Animação afeta a carreira do filme?
GS: Nunca tive um filme com tantos festivais e tanta visibilidade internacional. Além do Anima Mundi, já participamos de festivais bem importantes: Annecy, TIFF, Animation is Film, agora fomos indicados ao Annie. Foram mais de 50 festivais até agora. Quanto mais visibilidade pro filme, mais público e relevância ele pode alcançar, que é o que realmente importa de toda essa questão dos festivais.
FQ: Todo o universo de Tito e os Pássaros (tanto narrativo quanto estético) parece muito especial, principalmente, por não subestimar o público infantil. No jogo e no filme, as crianças são conduzidas por personagens complexos e diversos, pela arte belíssima da animação e ainda são incentivadas a desvendarem notícias falsas e a refletirem comportamentos na internet. Como essa temática tecnológica e comportamental foi escolhida? Por que optar por uma estética expressionista para o filme? Era uma preocupação produzir conteúdo diferente do padrão de consumo infantil (Disney/Pixar, por exemplo), relevante e ao mesmo tempo acessível para as crianças?
GS: O objetivo desde o começo foi fazer um filme sobre um tema supostamente adulto, a cultura do medo, só que com foco no diálogo com crianças. É claro que isso gerou vários desafios, mas acredito que a escolha de transformar o medo numa doença que “pega” e que gera transformações físicas – que foi o ponto de partida para a história – foi uma escolha bem acertada. O assunto maior, o medo transmitido e instigado pela mídia, ficou embutido dentro dessa metáfora de forma bastante clara, mas sem ficar pesado. Com isso, todos os esforços de Tito e de seus amigos passaram a ser como resolver a doença. Aí caímos dentro da estrutura tradicional da jornada do herói, que seguimos à risca (apesar de intervenções poéticas não tão tradicionais). O universo distópico vem a partir da doença do medo como centro da história e do de trazer medo para o filme sem criar situações chocantes demais que amedrontassem o público infantil. O expressionismo surgiu durante a pesquisa antes do início da produção do filme. O Gabriel Bitar trouxe a ideia pro resto da equipe e todos achamos incrível. Claro que o expressionismo funcionaria bastante bem para um filme que fala sobre o medo. Pra mim, a grande inspiração para guiar essa mistura foi o filme Os Goonies. Inspirados por esse filme tínhamos a convicção de que era possível fazer um filme divertido para crianças apesar da presença de elementos fortes. Nos Goonies, o desafio é resolver o problema do dinheiro para não perder a casa – que também é um problema adulto. No nosso caso, o problema é mais social, mas sabíamos que era possível construir uma aventura divertida dentro desse universo a partir da metáfora do surto, a doença do medo. Claro que também havia a preocupação de criar um visual único, que se destacasse no mundo. Nunca tivemos a intenção de competir com Disney/Pixar. Competir com eles é o mesmo que perder. Mas dá uma grande satisfação de apresentar o filme em Los Angeles para uma plateia com pessoal das antigas da Disney e ouvir elogios ao filme, inclusive do ponto de vista técnico. Recebemos várias perguntas sobre como conseguimos chegar ao visual que chegamos. E na verdade é um monte de soluções simples sobrepostas.
“O medo tem pautado nossas vidas mesmo sem a gente querer. Precisamos pensar e confrontar essa questão e suas causas.”
FQ: Recentemente, uma onda de reação conservadora atacou a produção Super Drags, da Netflix, alegando que a série queria influenciar negativamente as crianças. Você acredita que o público brasileiro, no geral, tem certa dificuldade em entender a animação como um gênero cinematográfico que pode ser infantil ou adulto, como qualquer outro gênero? Como você analisa o episódio?
GS: Não acompanhei essa controvérsia. Não sei opinar. No caso do Tito, acredito que o tema que tratamos esteja presente na vida de todo mundo, de direita, esquerda, centro, conservador ou não. O medo tem pautado nossas vidas mesmo sem a gente querer. Precisamos pensar e confrontar essa questão e suas causas.
Assista ao trailer de Tito e os Pássaros:
(Fonte: Tito e os Pássaros / YouTube)
Quero ver este filme. Eu adoro animaões , elas são demais e são sempre tão apaixonantes. Uma delas que eu adorei foi o lançamento deste anos, Pedro Coelho. Excelente filme! Tinha escutado muitos elogios filme pedro coelho crítica e depois de ver devo de dizer que realmente essa animação é excelente e muito criativa. Os filmes de animação são uma viagem cheia de diversão, emoção e aventura. É um filme feito para crianças, mas seguramente vai agradar aos adultos. Indico
Muito obrigada por comentar, Lara 🙂 e obrigada pela indicação também!