Quando pensamos em assistir a um filme ou começar a acompanhar uma série, os títulos estadunidenses com certeza são os que vêm primeiro à cabeça. Mesmo que a maioria dos brasileiros prefira filmes dublados a legendados – segundo uma pesquisa feita pelo portal Filme B em 2015 –, o áudio de uma produção não é aquilo que mais condiciona os espectadores a escolherem o que ver. Na realidade, a questão da distribuição de filmes e séries determina que o cinema do Brasil tenha muito mais opções norte-americanas do que quaisquer outras – incluindo as nacionais. E essa é a maior causa da preferência da população por longas-metragens e seriados dos EUA.
A partir desse tipo de disposição da indústria cinematográfica brasileira (na qual a distribuição de produções determina várias coisas), criou-se uma cultura “a la American way of life“, em que tendemos a rejeitar filmes europeus – em geral, não-britânicos –, asiáticos e, principalmente, africanos e latino-americanos. Tal rejeição implica em considerar obras francesas essencialmente cult, por exemplo, ou, quem sabe, em enxergar o cinema do Oriente Médio como chato, enfadonho. Então, somada à questão da distribuição, criam-se arquétipos em cima de quais nacionalidades e gêneros de filmes e séries são os melhores ou mais prazerosos de se assistir.
É só checar as grandes bilheterias do último ano no Brasil para se ter uma ideia: nos três primeiros lugares estão Velozes e Furiosos 8, Liga da Justiça e A Bela e a Fera (em ordem decrescente). Com a disseminação das plataformas de streaming, no entanto, o cenário muda um pouco quando o assunto é televisão: séries de diferentes locais do mundo estão bem à sua frente, disponíveis na tela do computador. Pensando nessa flexibilização da distribuição de séries, listamos abaixo algumas dicas para você “sair da bolha” e acompanhar produções de outros países. Olha só!
DICA #1: Comece pelos temas que mais te interessam
A gente garante: o que não falta no mundo são séries de TV. Existe de tudo quanto é tipo – de ficção científica, de comédia romântica, de aventura, revivals, remakes, com temas similares e abordagens diferentes, de cima a baixo, de cabo a rabo. Pode procurar pelo gênero que for, você vai acabar encontrando produções das mais diversas nacionalidades.
Um exemplo disso é a semelhança entre as séries Stranger Things e Dark – ambas originais Netflix, uma americana e a outra alemã. Por mais que os rumos de suas tramas difiram, as duas sinopses seguem o mesmo “bom e velho” clichê do gênero ao qual pertencem: suspense de ficção científica. Dark é uma série incrível, tem um ótimo elenco e aborda um tema complexo de maneira super didática. Mas, justamente por ser alemã, não teve a mesma repercussão da gigante Stranger Things. Mesmo que você acompanhe a primeira na opção legendada, eventualmente vai se acostumar ao idioma alemão, assim como ao comportamento dos personagens e a seus costumes – nada de tão diferente dos nossos, afinal de contas. E aí, que tal?
DICA #2: Permita-se aumentar seu repertório cultural
É claro que maratonar dez séries espanholas diferentes, por exemplo, não te fará um expert em cultura hispânica. Mas você pode, sim, sentir-se mais próximo(a) de aspectos gerais do país em questão. Quem nunca quis sair do Brasil e passar uma temporada fora, não é mesmo? Conviver com pessoas diferentes, conhecer novos lugares e experimentar todo tipo de costume é algo que a sétima arte, felizmente, pode nos proporcionar. E, a partir da adoção de produções de alta tecnologia na televisão, temos a oportunidade de assistir a séries que retratam os mais longínquos ambientes de forma fidedigna.
Falando em Espanha e Netflix, As Telefonistas, uma série original da plataforma, estreou sua segunda temporada no final do ano passado. O tema do programa é bastante popular e está em voga atualmente: lutas feministas da contemporaneidade. Mesmo que a trama se passe no final dos anos 20, seu contexto – reivindicação dos direitos femininos – não poderia ser mais atual. Muita gente, entretanto, sequer conhece a série espanhola. Mais uma vez, uma produção de língua não-inglesa não recebe o reconhecimento apropriado. Uma pena, mas nada que não se possa mudar. Para dar o primeiro passo, dê o play!
DICA #3: Ajude a indústria do cinema de outros países a ficar em evidência
Quanto mais pessoas assistirem às produções latino-americanas, mais atenção estas receberão. Assim, maiores também serão as chances de séries e filmes latinos ganharem reconhecimento internacional e de serem indicados a grandes premiações. Isso afeta o público diretamente quando ele recebe retorno da divulgação de suas produções nacionais. Ou seja, quanto mais em evidência nosso cinema estiver, maior nossa indústria cinematográfica se tornará, fortalecendo esse campo cultural – não somente o brasileiro, mas o de toda a América Latina.
A série cubana Quatro Estações em Havana retrata uma dupla de detetives na capital latina. Englobando questões históricas mundialmente relevantes do ano de 1989, a série é um “achado” da Netflix. Isso porque, novamente, a nacionalidade e a pouca divulgação de Quatro Estações não é páreo para produções como Mindhunter – também uma original da plataforma de streaming sobre investigações.
O ciclo “divulgação-atenção-notoriedade-crescimento cultural” parece não ter fim, já que o item anterior sempre será a causa direta do seguinte. Afinal, o crescimento da indústria cinematográfica só é possível a partir de investimentos financeiros, e, para isso, é preciso que algumas apostas sejam feitas sobre um determinado projeto. Além do que, para fazer essas apostas, é necessário um mínimo de garantia de que elas não serão em vão – como dados concretos sobre as demandas de um público específico, a respeito de um certo tipo de produção. Tudo isso significa que podemos – e devemos – dar mais chances às obras de língua não-inglesa. Já que vivemos num ciclo, o retorno nos será efetivo.
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