Quando A Bruxa de Blair estreou em julho de 1999 nos cinemas estadunidenses, o curioso espectador mal poderia imaginar as proporções que um filme com o orçamento de apenas 60 mil dólares tomaria. Já em agosto daquele mesmo ano, o sucesso foi tanto que a obra de terror faturou mais de 107 milhões de dólares. Assim, de assustadora nas telas, a produção passou a chocar também pelas circunstâncias reais de seu êxito.
Neste último caso, A Bruxa de Blair ressignificou todo o conceito do gênero, de modo a inspirar demais obras futuramente. Inclusive, à época de lançamento, algumas pessoas acreditavam que a obra fosse, mesmo, um documentário; graças ao compartilhamento incerto de informações, em uma precária internet.
Escrito e dirigido por Daniel Myrick e Eduardo Sánchez, o filme é, além do gênero cinematográfico de terror, um pseudodocumentário; ou seja, uma produção audiovisual que apresenta fatos supostamente reais (em formato documental), mas que são, na verdade, ficcionais.
Agora, vinte anos após a estreia do filme de Myrick e Sánchez, ele tornou-se um clássico do cinema e revolucionou não somente o Terror, mas o próprio pseudodocumentário. Produções como o primeiro Atividade Paranormal (2007), Cloverfield – Monstro (2008) e A Visita (2015) existem como consequência direta do sucesso de A Bruxa de Blair. Evidentemente, há outros títulos que pertencem a essa classificação, mas que não ao Terror; o que pode revelar a influência do filme de 1999 em toda a Hollywood e, quiçá, no cinema mundial.
Cenas encontradas
Mas, antes, é necessário voltar ao percursor desse gênero pouco usual da sétima arte. Holocausto Canibal (1980), do italiano Ruggero Deodato, é uma obra contraditória e emblemática. Isso porque a produção gráfica e polêmica – que contém violência real contra animais – retrata um grupo de documentaristas que desaparecera na Amazônia, ao filmar tribos canibais. Quando as gravações do grupo são descobertas, a forma a partir da qual são exibidas (como fatos realísticos) originou o termo “found footage“; cuja tradução literal para o português seria “cenas encontradas”.
Talvez pelo conteúdo explícito, Holocausto Canibal não lucrou nem um por cento do que A Bruxa de Blair conquistou de bilheteria; mesmo que o primeiro tenha faturado vinte vezes o seu orçamento. Quanto ao segundo, este, de fato, popularizou o found footage em níveis astronômicos.
Na obra de Myrick e Sánchez, três estudantes de cinema, Heather Donahue, Michael C. Williams e Joshua Leonard (todos como eles mesmos), viajam para Burkittsville, Maryland (EUA), no intuito de gravar um documentário sobre a lendária Bruxa de Blair. Logo, o trio perde-se na floresta dos arredores e passa a viver momentos de terror; assombrado pela figura enigmática que parece persegui-lo.
Além do found footage, A Bruxa de Blair inova ao distanciar-se da técnica de jump scare (mudança de imagem abrupta, no intuito de provocar susto), comumente usada no cinema; e, principalmente, ao nunca revelar o rosto da bruxa ao espectador. De ritmo constante e suspense avassalador, o horror psicológico da produção é o que mais impressiona. Não há quaisquer cenas gráficas, nem sugestão às formas e práticas realizadas.
Dessa forma, é esperado que o público atual não identifique os elementos que engrandecem o filme; uma vez que o apreciador médio do Terror espera por gore, gritos, efeitos especiais de ponta e uma trilha sonora afiada.
Herança
Ademais disso, é possível perceber como a originalidade da obra respalda em títulos como A Bruxa (2015), Um Lugar Silencioso (2018) e Hereditário (2018); não pelo falso documentário, mas ao apresentar um Horror pouco pretensioso, sem a intenção de lucrar pelo óbvio e/ou convencional.
Na contramão do Terror e de volta ao pseudodocumentário, demais filmes, como Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (2006), Tá Dando Onda (2007) e Popstar: Sem Parar, Sem Limites (2016), fazem parte da leva de produções realizadas após a disseminação do gênero.
Por isso, A Bruxa de Blair transformou profundamente a parte que coube-lhe do cinema. Já em 2019, esse clássico nem tão longínquo merece o devido reconhecimento, em pleno aniversário de duas décadas de lançamento.
Trailer original:
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