Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos: estreando no Abril Indígena, drama retrata jovem Krahô que rejeita o misticismo

A primeira cena de Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos, longa que estreia nesta quinta-feira (18), entrega que, diferente do que normalmente espera-se de um filme protagonizado por indígenas, este não é um documentário.

De noite e à beira de uma cachoeira, Ihjãc, jovem indígena da tribo Krahô, localizada no Tocantins, comunica-se com o falecido pai. O espírito solicita que o filho faça logo a festa de fim de luto, para que ele finalmente possa partir em paz para a aldeia dos mortos. Mas Ihjãc demostra certa resistência em cumprir a tradição e planeja escapar para a cidade, fugindo da obrigação de tornar-se xamã, o que o transformaria em alvo de feitiço de outros pajés. Escondendo-se do misticismo da aldeia ele passa a enfrentar, então,  uma porção de entraves impostos ao existir indígena no Brasil urbano contemporâneo.

‘Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos’ / Divulgação

Dirigido por João Salaviza e Renée Nader Messora, Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos propõe constantes exercícios sobre perceber o outro e compreender o nós. Diferente de documentários que se dedicam a investigar e apresentar alteridades, a obra combina misticismo e realismo para dar contexto social à tribo Krahô e jogar foco sobre a família de Ihjãc, que é tão brasileira quanto os outros mais de 200 milhões de brasileiros que vivem no país.

Sem perder a unidade, o filme vencedor do Prêmio Especial do Júri da mostra Um Certo Olhar, do Festival de Cannes, transita entre o documental, já que os Krahô não são uma tribo fictícia, por exemplo, e a ficção, onde as cenas de fogo sobre as águas ou a influência de uma ave sobre o destino do protagonista flertam com o fantástico.

Estreando em pleno Abril Indígena, período dedicado a marcar a luta e a articulação nacional do movimento indígena, o longa pretende explorar as relações cotidianas estabelecidas entre membros de uma mesma tribo e deles para com o país além dos limites de seu território. Para tanto, as camadas do viver em comunidade são descascadas; daí são abordados assuntos como direito à cidade e a autonomia na floresta/campo, sistema de saúde para povos indígenas, desamparo dos órgãos institucionais e a marginalização do brasileiro indígena nos centros urbanos.

Imagem: divulgação

Rodado ao longo de nove meses no território indígena Pedra Branca, Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos é fruto do trabalho de inserção audiovisual que a cineasta Messora vinha desenvolvendo na aldeia há algum tempo. Os atores não profissionais, portanto, participam ativamente dos processos de realização da obra e, ao ritmo natural de suas rotinas e rituais, inserem no fazer cinema o brasileiro que o Brasil se recusa a reconhecer.

Combinando cenas poéticas e íntimas com passagens que ampliam contextos micro para realidades macro, o longa propõe olhar sobre as particularidades e diferenças de cada grupo para, depois e com empatia, apontar um pouco do que tem dado errado na coletividade nacional – que ignora, principalmente, o fato de o país pertencer aos povos originários. Trata-se de um filme sobre transformações, algumas espontâneas e outras impostas, mas todas essenciais para a compreensão de que não há respostas simples sobre como funciona o Brasil que negligenciamos.

Trailer:

(Fonte: Embaúba Filmes / YouTube)

Leia também: ‘Ex-Pajé’, documentário de Luiz Bolognesi, denuncia as mazelas da evangelização indígena no Brasil

Ficha técnica

Direção: João Salaviza e Renée Nader Messora  

Duração: 1h54

País: Brasil, Portugal

Ano: 2019

Elenco: Henrique Ihjãc Krahô, Raene Kôtô Krahô e os habitantes da aldeia Pedra Branca – Terra Indígena Krahô  

Gênero: Drama

Distribuição: Embaúba Filmes  


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