Dirigido pelo polêmico cineasta argentino Gaspar Noé (de Love e Irreversível), Climax estreou nos cinemas brasileiros em janeiro deste ano. O thriller psicológico francês, com altas doses de violência, ganhou o principal prêmio da mostra Quinzena dos Realizadores, no consagrado Festival de Cannes (França). Agora, o longa-metragem encontra-se disponível para exibição aos assinantes da Netflix, desde o dia 1º de setembro.
Na trama do filme, um grupo de dançarinos urbanos dos anos 90 reúne-se para uma festa pós-ensaio, em um prédio isolado numa paisagem invernal. Inicialmente, o ensaio bem-sucedido, o êxtase da comemoração e o álcool acessível realçam os traços mais fortes da personalidade de cada personagem; de modo que alguns deles revelam – ao espectador – sua faceta mais vil, machista ou homofóbica.
Noite adentro, descobre-se que a sangria do buffet, a qual praticamente todos os presentes tomaram, fora batizada com o alucinógeno LSD. Assim, inicia-se uma série de neuroses coletivas e, inclusive, de psicoses delirantes; muito prazerosas para alguns, mas desesperadoras para outros.
Habilidade técnica
Apesar de não ter protagonistas, Climax foca, em determinados momentos, em algumas de suas excêntricas figuras, como na bailarina Selva (Sofia Boutella). Quando as coisas começam a sair do controle, por exemplo, Selva desenvolve um claro sentimento de angústia e, por conseguinte, perde a noção de dimensão espacial. Não há cenas em que a personagem fale abertamente sobre isso; mas, sua confusão psíquica fica evidente pela enorme habilidade técnica de Noé – que é, também, a maior qualidade da produção.
Como causa disso, a câmera inquieta e apurada do diretor, que filma de todos os ângulos, auxilia no entendimento do espectador quanto à visão turva dos dançarinos. Já a parede no fundo de um corredor assemelha-se à passagem para uma floresta de luz alaranjada. E, por falar em iluminação, as luzes artificiais do prédio, intensas e coloridas, denunciam o caráter alucinógeno da droga consumida; tal como o breu de uma falha elétrica, que substitui a claridade fluorescente pela obscuridade no antigo imóvel. Ademais, os sons de murmúrios dos desesperados acrescenta mais camadas de terror ao clima de mal-estar generalizado.
Além dos bailarinos, há o DJ Daddy (Kiddy Smile) e até mesmo um menino de menos de dez anos de idade, Tito (Vince Galliot Cumant), filho de Emmanuelle (Claude-Emmanuelle Gajan-Maull); quem inicialmente é acusada de ter batizado a sangria. Tito, a certa altura, experimenta a bebida e sofre com os efeitos devastadores da droga, mas em uma escala ainda pior do que a dos demais – considerando sua pouca idade. Logo, o menino é um dos mais afetados pela catástrofe que assola o grupo.
Inferno cristão
Entre cortes bruscos e tomadas de apenas alguns segundos, há planos-sequência longuíssimos em Climax – como na primeira cena do grupo no cenário do prédio (onde é ambientado quase todo o filme). Na metade inicial, o longa-metragem apresenta uma fusão de planos bem-humorados com cortes tendenciosos. Já a partir da segunda metade, a produção é condensada em um único plano-sequência, de desenrolar catastrófico. Dessa forma, a obra de Noé pode simbolizar o Inferno cristão; um local de perversão e sofrimento agudo, em que liberdade confunde-se com caos.
Portanto, se você curte assistir a produções com reviravoltas na trama e que retratem as consequências imediatas do consumo de alucinógenas – desde a “bad trip” (“viagem ruim”, em tradução livre) até o melhor estado de euforia –, Climax é uma ótima opção. Despretensioso em sua mensagem, o longa é carregado de artifícios para chocar quem o assiste, tal como toda a filmografia de Gaspar Noé.
Trailer legendado:
Leia também: Euphoria (HBO): adolescência e magnetismo.
Ficha técnica
Direção: Gaspar Noé
Duração: 1h33
País: França
Ano: 2018
Elenco: Sofia Boutella, Romain Guillermic, Souheila Yacoub
Gênero: Drama, Suspense
Distribuição: Imovision
COMENTÁRIOS