[Estreia] ‘Daphne’ chega aos cinemas retratando crise existencial de uma mulher de classe média

Aos 31 anos, Daphne (Emily Beecham) trabalha como auxiliar de cozinha em um restaurante de Londres. Ela mora sozinha, tem dificuldades em se conectar com as pessoas, mantém discussões frequentes com a mãe (Geraldine James) e leva a vida entre trabalho, monotonia, livros do filósofo Slavoj Zizek, festas, álcool e amantes.

Daphne (Emily Beecham) e a mãe (Geraldine James) / Divulgação

Sem demonstrar muito interesse por quem a cerca, ou pelas banalidades da vida, mas solitariamente preocupada com a mãe e com o emprego, a personagem, que dá título ao primeiro longa-metragem do diretor Peter Mackie Burns, parece confortável apenas quando escondida em seu cinismo compulsório.

A protagonista faz o que pode para se esquivar de encarar as responsabilidades, os perrengues e obstáculos da vida adulta. Até que, durante um violento (e atrapalhado) assalto, ela é obrigada a se comprometer com a situação. Daí em diante, confrontada com a realidade, Daphne começa a perceber que nem sempre a vida permite se esconder ou fingir, como costumava fazer com a mãe.

Mas não se engane, o filme, roteirizado pelo também estreante em longas Nico Mensinga, não desenvolve um arco no qual a protagonista desajustada, após passar por um evento traumático, encontra um amor e muda de vida. Daphne é mais como uma crônica existencialista sobre o amadurecimento na vida pós-moderna. Emily Beecham interpreta, brilhantemente, uma mulher que vive entre querer largar um estilo de vida medíocre e renegar o compromisso com a maturidade.

Daphne/ Divulgação

O assalto não funciona como reviravolta dramática, mas, sim, como ponto de partida para que a protagonista perceba seus privilégios e comece a repensar sua forma de lidar com o mundo. O mérito do filme está exatamente em conseguir fazer essa transição sem que pareça forçada ou clichê, e sem estereotipar a personagem como uma mulher “desalmada”. Por isso, uma crônica. A mudança de Daphne é cotidiana. Tanto o diretor quanto o roteirista se preocuparam em construir personagens, diálogos e situações muito possíveis e críveis. Todos muito mundanos, no bom sentido.

Tamanha verossimilhança com a vida pode fazer com que o longa se desenrole mais lentamente e sem grandes ápices na narrativa, mas nada que o deixe enfadonho – ou, talvez, enfadonho justamente como a vida é: várias situações aleatórias que culminam em algum momento de maior drama, alegria ou tristeza, para depois voltar a ser um aglomerado de situações que vão se desenrolando.

Por outro lado, o carisma dos personagens, assim como todos os seus defeitos, são suficientes para manter o espectador engajado, apenas esperando pelo próximo diálogo – com destaque para o personagem David, de Nathaniel Martello-White.

Daphne transporta ao cinema, através de uma personagem cheia de camadas, o agridoce que é ver a vida passar, todas os estratagemas psicológicos que usamos para nos esconder do convívio necessário com o outro, e todo egoísmo e individualismo que carregamos conosco. Ou seja, trata-se de um leve, mas não pouco eficaz, dedo na ferida.

Veja o trailer oficial:

 

Ficha técnica

Ano: 2018

Duração: 1h30

Direção: Peter Mackie Burns

Nacionalidade: Reino Unido

Elenco: Emily Beecham, Geraldine James, Tom Vaughan-Lawlor, Nathaniel Martello-White

Gênero: Drama

Distribuição: Supo Mungam Films

 

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