Nesta quinta (09), estreia o novo filme de Gabriela Amaral Almeida (A Mão Que Afaga), o thriller psicológico O Animal Cordial. Notável por ser um filme de gênero (ou seja, que caracteriza-se por elementos muito marcantes de um gênero próprio), o sangrento longa-metragem se passa inteiramente dentro de um restaurante de classe média.
Após sofrerem uma tentativa de assalto, os funcionários e clientes do estabelecimento passam a viver uma noite de intenso terror. O chef de cozinha Djair (Irandhir Santos), e os clientes Amadeu (Ernani Moraes), Verônica (Camila Morgado) e Bruno (Jiddú Pinheiro), ao contrário do que se poderia imaginar, ficam reféns do dono do restaurante: o violento e frio Inácio (Murilo Benício) – e não dos assaltantes. Além de Inácio, a garçonete Sara (Luciana Paes), personagem que mais ganha destaque ao longo do filme, é uma mulher obcecada por seu chefe e que, por isso, torna-se sua cúmplice.
Segundo o produtor Rodrigo Teixeira (Me Chame Pelo Seu Nome), em coletiva de imprensa do filme, em São Paulo, a diretora exigiu que Luciana Paes fosse escalada para o elenco. “O processo do surto criativo da Gabriela [Almeida], até ela filmar esse longa, demorou quatro meses. […] A pós-produção durou um ano e meio”, comenta Rodrigo, que frisa a ausência de recursos públicos na produção.
“Esse filme, quando eu tive a chance de assisti-lo no ano passado, fiquei mais assustada com o que estava fora da sala de cinema do que com o [próprio] filme. Porque, quando a gente fez, para mim, ele [o longa] era mais ficcional. E, agora, eu reassisti e vi que ele era mais alegórico”, avalia Paes sobre sua personagem e a trama central.
Já Almeida justifica no caos político-social brasileiro a sua inspiração para o roteiro: “Eu acho que a gente está passando por um momento bastante tenso [politicamente], e isso acaba pedindo da arte, ou do criador [de arte], uma intervenção mais direta”. Para a trama, um assalto em um restaurante de São Paulo, ocorrido semanas antes da escrita do argumento da produção, serviu como o ponto de partida. “Começamos a nos questionar como o medo vende […], como o medo virou um artefato”, completa a diretora.
Tenso desde o início, O Animal Cordial aborda a deterioração dos valores éticos humanos, tal como sua animalização, diante de fatos extremos. Os bandidos do filme, Magno (Humberto Carrão) e Nuno (Ariclenes Barrosos), passam de vilões a vítimas de Inácio. E, mesmo em cenas anteriores à explosão do clímax, a angústia passada aos espectadores, ainda que sutil, é exposta de modo claro; como em um toque de mãos entre Inácio e Sara, ou na rivalidade entre esta última e a dondoca Verônica.
O chef Djair, interpretado por Santos em uma das melhores interpretações do filme – juntamente com Paes e Benício – é um dos grandes destaques da produção. O personagem não-binário é, aparentemente, o único indivíduo que segue ideais de ética naquele espaço limitado. Enquanto preso e amarrado na cozinha que comanda, Djair demonstra uma humanidade que, no salão do restaurante, é gradualmente anulada. Inácio e Sara cometem um banho de sangue ao redor das mesas e, em cima do líquido vermelho, copulam como dois animais.
A trilha sonora pontual e assustadora lembra um pouco a delicadeza cínica da Twin Peaks (1990 a 1991) de David Lynch. Os enquadramentos são simples, mas marcantes – quando trabalhados em close, por exemplo. Assim, a história mostra-se uma grande alegoria do caos urbano e da tendência humana à autodestruição.
O impacto causado no espectador é incontestável, uma vez que tanta violência e cenas gráficas chocam pelo realismo com o qual são construídas. “Os personagens vão surgindo por conta de como a gente está vivendo hoje…a interação dramática entre eles é de embate. Então, a visceralidade [do longa-metragem] é inevitável. Deixar na entrelinha, para mim, hoje, não me interessa”, expõe Almeida sobre suas técnicas narrativas.
O Animal Cordial entra em circuito comercial em diversos cinemas brasileiros. Fique de olho nas estreias da semana, e não perca a oportunidade de vivenciar uma torrente de emoções em frente às telas.
Ficha técnica
Direção: Gabriela Amaral Almeida
Duração: 1h38
País: Brasil
Ano: 2017
Elenco: Luciana Paes, Murilo Benício, Irandhir Santos, Humberto Carrão
Gênero: Suspense
Distribuição: Califórnia Filmes
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