Somente cinco meses separam a primeira da segunda temporada de O Escolhido. Como resultado do curto espaço de tempo entre uma estreia e outra, a nova temporada da produção apresenta conflitos – e defeitos – repetitivos; além de uma trama genérica que, de novo, pouco se esforça para deixar de transparecer artificialidade.
Os médicos Lúcia (Paloma Bernardi), Damião (Pedro Caetano) e Enzo (Gutto Szuster), antes centrais, agora estão quase subutilizados. O arco principal se volta, então, ao Escolhido (Renan Tenca). Desta vez, ele precisa enfrentar seu rival Serpente, uma entidade maligna que assume a forma de qualquer pessoa. O embate direto entre os dois, no entanto, não acontece. Em vez disso, a temporada enrola o desenvolvimento deste segmento, desviando atenção para conflitos desimportantes, protagonizados por personagens secundários que soam descartáveis por aparecerem apenas quando conveniente.
AS NOVIDADES
São novos seis episódios dedicados exaustivamente à introdução do Serpente e à escolha de uma nova Angelina/vida para o Escolhido. O cotidiano de Aguazul e a individualidade de seus moradores seguem vagamente delineados. Lúcia volta para a tal vila obrigada por Enzo, numa sequência de qualidade duvidosa e que beira o pastelão dramático; e Damião sequer abandonou o lugar, sabe-se lá por qual motivo.
Nenhum dos personagens demonstra evolução ao longo dos 12 episódios. Todos são limitados a um ciclo vicioso de motivações e traços de personalidade frágeis e previsíveis. Como maior novidade da temporada há a entrada de Giselle Itié no elenco, interpretando uma jornalista que pretende desvendar os segredos do Escolhido. Nesse cenário, Silvino (Francisco Gaspar) ainda é o personagem mais carismático da história; enquanto Eva (Itié) tem seus méritos por percorrer um arco narrativo próprio.
Adiando ao máximo a revelação de qualquer mistério que envolva o protagonista “curandeiro”, a segunda temporada de O Escolhido apela para cenas de maior violência e se propõe a tocar em assuntos como mercado e turismo religiosos, fanatismo e ciência – como sempre, superficialmente e via diálogos pobres e pouco naturais.
Somente nos minutos finais da temporada, quando um gancho para novos episódios se faz necessário, é que a produção entrega informações que podem render alguma coisa no futuro. Dessa maneira, a temporada dois da original Netflix mais parece uma enorme transição entre a primeira e uma possível terceira leva de episódios.
O PANTANAL
Parecia realmente bastante promissora a ideia de uma série sobrenatural ambientada no Pantanal brasileiro, mas O Escolhido só faz mostrar-se um frustrante e enlatado retrato da região. O vai e vem enfadonho entre Aguazul e o acampamento, costurado por imagens de transição das belas paisagens do Pantanal, não dá conta de contextualizar a essência humana, cultural e ambiental das locações. Com exceção de uma onça aqui e um mito do minhocuçu ali, o Pantanal de O Escolhido, tão engessado como fajuto, poderia ser qualquer floresta ou estúdio do mundo; para a trama, tanto faz.
Mas para além de todas as insuficiências já apontadas, o que mais incomoda na obra é o tratamento dado aos indígenas. Chega a ser constrangedor que, em pleno 2019, uma série brasileira use personagens indígenas como figurantes; meros adereços de ambientação. Seria mais honesto sequer colocá-los em cena.
Ao final, O Escolhido continua sem conseguir entregar boas cenas de ação, suspense arrojado, bons diálogos, bons conflitos de relacionamento, personagens memoráveis ou comentários sociais consistentes. Fica claro que, sozinha, uma boa temática não é suficiente para fazer uma série acontecer. Assim vai tomando forma uma história que usa o centro-oeste brasileiro, e em certa medida suas contradições, apenas como pretexto; e que, portanto, muito pouco tem de especial.
Leia a crítica da 1ª Temporada de O Escolhido aqui.
Ficha técnica – 2ª temporada
Direção: Michel Tikhomiroff
País: Brasil
Ano: 2019
Elenco: Paloma Bernardi, Pedro Caetano, Gutto Szuster, Renan Tenca, Francisco Gaspar, Giselle Itié
Gênero: Suspense, Drama
Distribuição: Netflix
Amo prestigiar o audiovisual nacional e assisto todos os originais Netflix brasileiros mas confesso que essa tá difícil de acompanhar.
A gente também fica bem triste quando precisa criticar negativamente alguma produção nacional