Ganhadora do prêmio Platino na categoria Minissérie Cinematográfica Ibero-Americana de 2017, Quatro Estações em Havana é uma série noir (subgênero policial com ambientação urbana, anti-heróis e influência do expressionismo alemão) baseada nos livros do prestigiado escritor cubano Leonardo Padura, responsável também, junto de sua esposa Lucia Lopez Coll, pelo roteiro.
Padura – conhecido no Brasil por seu livro O Homem que Amava os Cachorros – começou a escrever em 1990 o romance Passado Perfeito, primeiro de sua tetralogia Estações Havana e marco do surgimento do detetive Mario Conde, protagonista dos livros e da série.
Conde, vivido por Jorge Perugorría, é um tenente da polícia de Havana muito perspicaz, ácido e engenhoso, mas também frustrado por não ter seguido a carreira de escritor; sua verdadeira paixão. Em diversos momentos, ele se auto intitula “um nostálgico de merda” ou “um perdedor com uma vida caótica”, mesmo sendo muito admirado pelas pessoas que o cercam, como seu parceiro Manolo (Carlos Enrique Almirante). Esses ares agridoces do detetive cubano dão exatamente o tom de todos os episódios.
Ao contrário do que acontece nas famosas séries policiais norte-americanas, os policiais aqui não são heróis que sempre vencem no final, apesar dos obstáculos. Eles são pessoas comuns, com seus conflitos, defeitos e qualidades. Seus empregos são apenas empregos, nem de longe imponentes como um cargo no FBI.
Produzida pela TVE Espanhola, filmada em Cuba e distribuída no Brasil pela Netflix, Quatro Estações em Havana é classificada por seu diretor, Félix Viscarret, como um noir caribenho. Mario Conde e suas investigações policiais são um pretexto para apresentar as belezas e as contradições de Havana, fazendo da cidade uma personagem à parte.
Ambientada em 1989 – quando Cuba já sofria com o bloqueio econômico dos EUA, o Muro de Berlim havia caído e a instabilidade política global também afetava o país caribenho –, a história de Padura retrata um lugar onde as coisas caminham em um outro ritmo (diferente de outros países), quiçá em uma “outra época”. Isso porque o embargo americano fica evidente através da arquitetura, dos automóveis antigos, da tecnologia obsoleta e dos diálogos sobre escassez de comida.
Muitas questões caras ao cotidiano e ao contexto político de Havana são tratadas no decorrer dos quatro episódios, tais como: a corrupção da polícia, os jogos de poder, as consequências causadas por um mundo que virou as costas para Cuba, ou temas ainda mais atuais, como o preconceito de gente que se considera progressista, mas reproduz preconceitos contra homo e transsexuais – como podemos ver no terceiro episódio, quando Conde, agindo como anti-herói, diz que “não dá para confiar nesses gays”.
Ainda assim, é impossível terminar Quatro Estações em Havana sem estar completamente apaixonado pela cidade e com muita vontade de conhecê-la. O que se deve, em grande parte, à trilha sonora e às longas tomadas aéreas que mostram a ilha caribenha do jeito mais poético e envolvente possível. Trata-se de uma série tão honesta que fica difícil não gostar.
E, se você sentir vontade de se aprofundar nas questões políticas e econômicas de Cuba depois de acompanhar as peripécias de Mario Conde, vale conferir a série documental “Ilhados: Cuba e Estados Unidos, do Bloqueio à Reaproximação”, produzido pela jornalista Michele de Mello.
Com episódios de aproximadamente 40 minutos, a websérie (disponibilizada no YouTube) traz relatos de especialistas, historiadores, economistas e três gerações de cubanos que apresentam suas visões sobre as diferentes fases vividas no país, desde o bloqueio até a recente reaproximação com os Estados Unidos. É uma obra bem pertinente e pode ser interessante para uma contextualização mais profunda da conjuntura de Quatro Estações em Havana.
Ficha técnica
Criação: Félix Viscarret
País: Cuba, Espanha
Ano: 2016
Elenco: Jorge Perrugorría, Carlos Enrique Almirante, Juana Acosta
Gênero: Noir Policial, Drama
Distribuição: Netflix
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