Tag: crise de refugiados
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Conheça 3 ótimos filmes sobre crises migratórias e refúgio
Nos últimos dois anos, o Brasil entrou para o mapa dos países que lidam diretamente com alguma aresta da crise de refugiados espalhada pelo mundo. Sem qualquer tipo de ação contundente de um governo federal ilegítimo e fraco, a chegada dos refugiados venezuelanos em terras antes conhecidas como receptivas se tornou tristemente caótica.
Desde que os aparatos públicos (principalmente serviços médicos) das prefeituras das cidades de Roraima que fazem fronteira com a Venezuela passaram a estar constantemente sobrecarregados pelo grande fluxo de venezuelanos, brasileiros sentem-se abandonados pelo Estado. Como consequência, as tensões sociais cresceram e a onda de xenofobia e violência contra os imigrantes só aumenta na região – acompanhando o crescimento da atmosfera de intolerância que toma o país num ano em que a eleição conta com candidatos absolutamente preconceituosos e violentos.
Diante da total falta de preparo do governo brasileiro para lidar com o êxodo venezuelano, brasileiros e refugiados ficam largados à própria sorte, dependendo da organização e boa vontade de servidores públicos que também estão abandonados pelo Estado e pressionados pelas novas demandas, e à mercê de jogos de interesses políticos de quem pretende ganhar a eleição 2018, na região, usando essa tragédia humanitária como munição.
Por aqui, o povo venezuelano chega para tentar uma grave crise econômica e humanitária, deixando tudo para trás e esbarrando em -mais- violência (física, material, moral, emocional). Pelo mundo, são os sírios, palestinos, mexicanos… São pessoas diversas, que se arriscam numa jornada incerta porque, geralmente, não têm mais nada a perder. São cidadãos que, além de sobreviverem a situações de perseguições, guerras e/ou miséria, ainda encaram a barreira do (não) pertencimento, da resistência ao outro dos países onde buscam ajuda e refúgio.
Para te ajudar a entender um pouco mais sobre alguns dos aspectos e processos que envolvem esses diferentes tipos de movimento de migração, selecionamos alguns filmes que trazem distintas (e ricas) abordagens sobre o tema:
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A primeira indicação é o brasileiro
Era o Hotel Cambridge
Por que Persépolis é uma obra cada vez mais atual
A animação francesa Persépolis – baseada nos quadrinhos autobiográficos e homônimos de Marjane Satrapi –, estreou no Festival de Cannes de 2007 e, tão logo, despertou um crescente interesse internacional. No festival, o filme recebeu o prêmio do júri; já no Oscar do ano seguinte, foi indicado na categoria de Melhor Animação, o que contribuiu para a fama relativamente popular do longa-metragem.
Escrito e dirigido pela própria Satrapi, ao lado de Vincent Paronnaud, a produção conta os momentos mais marcantes da infância e da juventude da iraniana Marjane. Em meio às atribulações do instável e violento governo do Irã setentista, a menina luta para manter-se bem e vivenciar tudo aquilo que fora restringido ao sexo masculino. Uma feminista “de coração” desde sempre, a protagonista da vida real vem de uma família de idealistas comunistas, com figuras extremamente interessantes e corajosas.
Ainda uma criança que sonha em se tornar vidente, Marjane perde seu querido tio, executado como inimigo do Estado. Com a passagem dos anos e o aumento das repressões (principalmente de gênero), a adolescente rebelde, que passa a curtir punk e, depois, heavy metal ocidental, entra em conflito com suas condições de vida limitadas e, como medida de proteção por parte de seus pais, é enviada à Áustria para terminar os estudos.
Na nova realidade, a jovem tem de lidar com uma comunicação diferenciada, novas companhias, outros hábitos alimentares e modos de enxergar a vida, em geral. O início é difícil, o meio é um pouco mais fácil e o final de temporada, em terras austríacas, é ainda mais cruel do que seu começo. Pulando de casa em casa e, posteriormente, vivendo nas ruas geladas do país europeu, Marjane retorna à casa dos pais, no Irã, após anos de “exílio”.
A animação em preto em branco é – infelizmente – cada vez mais atual no cenário contemporâneo. Isso, porque as guerras no Oriente Médio, a crise dos refugiados, a chamada islamofobia (medo ou aversão à comunidade muçulmana) e as discussões sobre feminismo são temas atualíssimos. Marjane, além de forte mulher, empoderada e de enorme consciência social, representa o que há de mais humano em um cidadão.
A honestidade do texto de Satrapi é admirável e, por mais duro que seja acompanhar a vida nada fácil da personagem, sentimos uma grande identificação com momentos pontuais de sua narração. Percebemos, a certa altura, que Marjane poderia ser qualquer garota, de quaisquer lugares do mundo. E, quanto mais bradamos por nosso direito de equidade social com o sexo masculino, mais nos aproximamos de jovens como a protagonista de Persépolis.
Por mais simples que seu traço seja, por mais única que sua história pareça ser e por melhor que seu destino tenha sido no futuro (nosso atual presente), a juventude de Marjane é um verdadeiro ensinamento sobre ética e a idealização de uma sociedade mais justa. Se você ainda não assistiu a Persépolis, dê uma chance e contemple essa breve – e intensa – história do início de uma vida.