Payton Hobart (Ben Platt), protagonista de The Politician, nova série original da Netflix, acredita, desde muito novo, possuir uma vocação: a política. Não por ser uma pessoa altruísta ou engajada com projetos específicos, mas por ser absolutamente egocêntrico e se sentir merecedor de chegar à Casa Branca.
Filho adotado de pais riquíssimos e muito mimado pela mãe Georgina (Gwyneth Paltrow), o protagonista conta com a ajuda de fiéis amigos – dois estrategistas e uma aspirante a primeira-dama, todos tão ambiciosos quanto ele – para dar início à sua carreira política vencendo um primeiro desafio: a eleição do grêmio estudantil do ensino médio.
Payton não chega a ser um adolescente rico tirano e desumano, mas mostra-se um político pouco autêntico. Sua obsessão com a vitória o torna cínico, formatado e demagógico.
Criada por Ryan Murphy (American Horror Story), Brad Falchuk e Ian Brennan, The Politician parte da premissa de que “está todo mundo mal” para capturar a essência contemporânea da política espetáculo, esvaziada de sentido de comunidade, efêmera e personificada em figuras muito mais envolvidas com aspirações pessoais de grandeza do que com compromissos coletivos e de transformação.
Além da contextualização temática profundamente atual, a série estabelece estética e diálogos excêntricos, certeiros e por vezes propositalmente engessados ao melhor estilo Wes Anderson para dar o tom satírico da crítica a uma elite deplorável; tão endinheirada quanto abobalhada e medíocre.
Aqui, Murphy também repete a parceria de outros carnavais com o ator Dylan McDermott e a formidável Jessica Lange.
REPRESENTATIVIDADE
Representatividade é um dos alicerces de The Politician. Primeiro, porque a série em si é diversa. Há muitas mulheres no elenco, personagens brancos, negros, héteros ou não, com deficiência ou não. Há gente de todos os jeitos, tal como na vida. E embora tal diversidade não gere discussões específicas (e batidas) sobre opressões no ambiente escolar, ela serve como ponto de partida para tratar de como o marketing político instrumentaliza pautas de minorias sociais para alavancar campanhas.
Assim que percebe sua falta de carisma com “o povo”, por exemplo, Payton decide que precisa de um vice que provoque empatia no eleitorado. Não porque ele realmente tenha aproximação das pautas anti-opressão, mas porque é necessário vencer. É assim, portanto, que o protagonista começa a cogitar ter como vice o único garoto haitiano da escola ou a garota que está tratando um câncer.
Payton pode saber mandariam, ter estudado sobre todos os presidentes estadunidenses, falar alguma coisa sobre saúde mental ou dizer que os canudos são os grandes vilões do meio ambiente, mas, no fim das contas, ele não tem a menor ideia do que seu eleitorado precisa no dia a dia – e nem faz questão de ter.
Dessa maneira, e com uma valiosa mistura de personagens que fogem dos clichês geralmente atribuídos a seus perfis com outros que abraçam completamente a caricatura, The Politician traz ao centro da trama questões que, hoje, são primordiais para questionar a superficialidade dos discursos e práticas da política tradicional.
O ELEITOR
Um dos episódios que mais merece destaque na temporada leva o título de ‘O eleitor’. Como o próprio nome sugere, ele aborda um dia na vida de um eleitor mediano do colégio: um garoto não tão rico, branco, machista, completamente despolitizado e alheio à corrida eleitoral.
Nele, os candidatos disputam os votos dos alunos indecisos e, e em meio a um grandioso duelo de egos, tentam contornar a apatia causada pela crise de representatividade democrática versão estudantil.
Apesar de o episódio servir como uma espécie de apêndice da trama principal, ele se encaixa perfeitamente com o resto da narrativa. Muito diferente do que acontece com o núcleo de Jessica Lange, que é ótimo e serve para colocar mais caos na trajetória de Payton, mas ocupa muito mais espaço do que o necessário.
Ao final, o ensino médio numa escola de elite parece ter sido mesmo um bom lugar para o início de The Politician. Ali, no meio das cruéis e exageradas picuinhas de adolescentes ricos, a produção encontra o paralelo perfeito para ridicularizar, com humor e boas doses de melodrama, as imperfeições da desgastada política contemporânea.
Logo, a identidade da série, cujo tom único e envolvente de crítica é tão colorido e espalhafatoso quanto ácido, está posta. Fica para a segunda temporada, então, a missão de aprofundar o que já deu certo; alçando Payton a outro patamar político e mostrando que talvez as renomadas instituições democráticas do Estado não passem de um outro tipo de ensino médio.
Trailer:
Ficha técnica
Criação: Ryan Murphy, Brad Falchuk e Ian Brennan
País: EUA
Ano: 2019
Elenco: Ben Platt, Zoey Deutch, Lucy Boynton, Jessica Lange, Gwyneth Paltrow
Gênero: Comédia, Drama
Distribuição: Netflix
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