Ana é uma bruxa em negação – uma completamente distante dos estereótipos de bruxa, aliás. Interpretada por Gabriela de la Garza, a protagonista de Amarração no Amor (Amarres, no original), primeira série mexicana original HBO Max, cresceu vendo a avó vender feitiços de amarrações amorosas no mercado de Sonora, na Cidade do México, conhecido por seus vários espaços dedicados à magia e à santeria. Porém, algo deu errado no passado, fazendo com que a personagem se recusasse por anos a colocar em prática o que aprendeu com a falecida.
Trabalhando como alfaiate, então, Ana mantém com aperto os seus três filhos de pais diferentes: Armando (Martín Saracho), o gênio; María (Alicia Jaziz), a artista; e Olga (Nicole de Albornoz), a pequena que conversa com Deus. Por isso, quando o pai de Olga decide disputar a guarda das crianças na justiça, uma crise financeira e emocional recai sobre os ombros da protagonista, obrigando-a a recuperar a tradição familiar e tocar o negócio deixado pela avó, muito mais popular e rentável que seus trabalhos de costura.
Assim, Amarração no Amor se apresenta como uma dramédia familiar despretensiosa, orientada pelos conflitos de uma mulher comum transbordando diferentes crises: a perda da própria individualidade, a preocupação com o dinheiro, o medo de perder a guarda dos filhos, o receio constante de não dar conta das demandas de cada um desses filhos, a necessidade de confrontar várias desconfianças para revisitar os ensinamentos da avó, os dilemas éticos impostos pelas dinâmicas dos rituais de amarração e, além de tudo, o envolvimento num inusitado triângulo amoroso.
DRAMÉDIA FAMILIAR
Criada por Fernanda Eguiarte, que diz em diversas entrevistas ter querido desmistificar a mãe mexicana com Ana, a série tem como ponto alto seus personagens multifacetados. Parece não interessar ao enredo estipular grandes antagonismos. Em vez disso, temos Olga, a garotinha que aprendeu com o pai a ser católica e que, a princípio, se mostra preocupada sobre a mãe ter pactos com o demônio. Armando, um adolescente inteligente e extremamente racional, cujo maior conflito não é sua homossexualidade, mas, sim, conviver com o autismo e a falta de traquejo no trato social. María, a jovem rebelde obcecada em saber por que o pai tirou a própria vida. E até o conservador e religioso ex-marido de Ana, Jorge (Mauricio Isaac), que apesar de suas dificuldades em lidar com a orientação do irmão de sua filha, demonstra ter algum tato para compreender a síndrome do garoto.
São pessoas imperfeitas, com problemas e desejos. Gente que às vezes acerta e outras se equivoca. Membros de uma família de classe média não muito tradicional, mas real em todas as suas especificidades e experiências. Elementos complementares, não opostos.
Como tempero extra, o flerte com o sobrenatural, além de bem-humorado, acaba por compor outras camadas na teia de relações e dilemas de Ana, ao mesmo tempo em que revela fragmentos de um México onde magia, crenças pré-hispânicas e cristianismo convivem das mais diferentes formas, nos mais diferentes lares, tecendo os mais variados tipos de relação.
Básica na condução dos conflitos, embora rica em arranjos de personagens, Amarração no Amor encontra no ótimo desempenho de De la Garza seu alicerce principal, tornando-se charmosa e convincente ao abordar os malabarismos que mulheres contemporâneas necessitam fazer para equilibrar os pratos das exigências do dia a dia, sem se perder de si mesmas.
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Trailer:
Ficha técnica
Criação: Fernanda Eguiarte
País: México
Ano: 2021
Elenco: Gabriela de la Garza, Hugo Catalán, Juan Pablo Medina, Nicole de Albornoz, Alicia Jaziz, Regina Flores Ribot, Martin Saracho
Gênero: Drama, Comédia
Distribuição: HBO Max
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