Dark (2ª temp.): 4 arcos narrativos esclarecidos

ATENÇÃO! Este texto contém spoilers da 2ª temporada de Dark (da Netflix).

Tendo estreado a sua segunda temporada na última sexta-feira (21), a série alemã Dark, uma produção original da Netflix, continua um sucesso estrondoso. E, se você tem dúvidas quanto aos arcos narrativos dos novos episódios, este texto pode ajudá-lo a esclarecer melhor as coisas. Confira abaixo a elucidação de quatro temas e/ou pontos complexos da série.

1. A máquina do tempo e o portal na caverna

De viagens no tempo a acidentes nucleares, os personagens de Dark atravessam portais interdimensionais e buracos negros. Neste último caso, a energia que irradia de uma máquina rudimentar é aquilo que liga duas – ou mais – épocas distintas. Já quanto ao buraco de minhoca, dentro de uma caverna da cidade fictícia de Winden, este fora aberto por uma das explosões atômicas na História da série.

Na segunda temporada, o protagonista Jonas (Louis Hofmann) também encontra algo popularmente conhecido como “Partícula de Deus”. De nomenclatura real Bóson de Higgs (derivada de Peter Higgs; físico britânico laureado com o prêmio Nobel de 2013), a partícula elementar complementa o notório Modelo Padrão das demais partículas – principalmente quanto à medição de suas massas subatômicas.

Jonas (Louis Hofmann)/ Divulgação

Anteriormente, em um livro de 1993 do físico estadunidense Leon Lederman (1922 – 2018), o termo popular de Higgs – que é repetido inúmeras vezes na série – fora cunhado por razões comerciais; considerando que a ideia inicial do estudioso era nomear sua obra de Goddamn Particle (“Partícula Maldita”, em tradução livre). No entanto, pela proximidade fonética, a palavra “goddamn” fora substituída por “God” – ou melhor, “Deus”.

Assim, a produção Netflix faz uso de uma bem-vinda licença poética; já que o bóson fictício determina viagens para qualquer tempo desejado – além de à tríplice central de tramas dos anos 1954, 1987 e 2020. Ou seja, no geral, e no intuito de abrir espaço a abordagens filosóficas e espirituais, Dark distancia-se de hipóteses científicas.

2. Os vilões

Noah (Max Schimmelpfennig/ Mark Waschke), Claudia (Julika Jenkins/ Lisa Kreuzer) ou Adam (Dietrich Hollinderbäumer): qual deles será, realmente, o grande vilão da série? Na primeira temporada, o misterioso padre Noah (Waschke) revelou-se o principal antagonista da trama. Agora, uma versão mais jovem do personagem (Schimmelpfennig) – e tão perversa quanto a outra – é introduzida logo no episódio de abertura.

A seita da qual faz parte, aliás, Sic Mundus Creatus Est (de nome derivado da Tábua de Esmeralda; texto milenar que dera origem à Alquimia), é, mesmo após o último episódio, um enigma em Dark. Liderado pelo desfigurado Adam, o grupo aparentemente inescrupuloso tem origem incerta. Assim, a representação vilanesca da série está garantida – independentemente de qualquer coisa.

Adam (Dietrich Hollinderbäumer)/ Divulgação

Já em 2020, a viajante do tempo Claudia (Kreuzer) opõe-se veementemente a tudo aquilo que os membros da seita representam. De volta a 1987, em um dos saltos alineares da narrativa, uma Claudia de meia-idade (Jenkins) mostra-se digna do apelido “Diabo Branco”; que é mencionado durante os episódios anteriores à revelação.

Em que momento de sua vida a personagem arrependeu-se dos graves erros do passado? Será, mesmo, que ela sofreu uma redenção, depois dos eventos de 1987? Ou, ao contrário disso, seria Noah, de fato, tudo aquilo que Claudia diz de sua personalidade? Teria Adam, a versão de terceira idade de Jonas, um papel direto em tudo de ruim que acontece em Winden? Para responder a tantas dúvidas, é preciso aguardar até a próxima – e última – temporada.

3. O aprofundamento no determinismo causal

Presos em um eterno paradoxo, os personagens de Dark têm como maior preocupação a falta de liberdade. Se suas histórias estão pré-determinadas por inícios futuristas e finais passados, como romper com ciclos infinitos e insistir na concepção do livre-arbítrio? Exatamente por isso, a decisão de Michael (Sebastian Rudolph), pai de Jonas, ao tirar a própria vida, aparece-nos na segunda temporada como um sacrifício para o filho viver; e não como consequência de uma doença mental.

Em uma lógica da filosofia pré-determinista, na qual o determinismo é explicado por relações de causalidade, a cadeia causal depende totalmente das condições iniciais do universo. Isso significa que todo e qualquer evento do presente é consequência de uma série interminável de fatores passados. Na produção da Netflix, como o tempo é circular, e não algo linear, o pré-determinismo é uma possibilidade realista.

Além disso, o chamado pós-determinismo também aplicaria-se ao contexto da série. Neste caso, por exemplo, a causalidade do universo seria determinada por alguma finalidade; uma entidade exterior a tudo isso – ou melhor, por Deus. Já que Dark aborda ideais religiosos, como no caso da Partícula de Deus, há a chance de existência espiritual dentro de sua ficção. Talvez, a produção nunca tenha de optar por entre ciência, filosofia ou religião; mas, a tentativa de harmonizar as três áreas é, no mínimo, interessante.

Imagem: divulgação

4. As famílias de Winden

Nessa onda de viagens temporais e origem indefinida das coisas, os laços familiares definem-se através de visitantes do futuro e do passado. Como na primeira temporada, na qual descobre-se que Mikkel (Daan Lennard Liebrenz) e Michael são a mesma pessoa. Mikkel, que nasceu na primeira década deste século, retorna ao ano de 1986; cresce na década de 1990, e tem um filho (Jonas) um pouco mais velho do que ele próprio.

Assim, as três famílias centrais de Dark – Nielsen (a família biológica de Mikkel); Kahnwald (a originada por Mikkel, depois dele voltar no tempo e tornar-se Michael); Tiedemann (a de Claudia), e Doppler (a da policial Charlotte, interpretada por Karoline Eichhorn) – são todas formadas por, pelo menos, um membro fora de suas épocas.

Claudia (Julika Jenkins)/ Divulgação

Na nova temporada, isso fica ainda mais evidente. O padre Noah é irmão de Agnes Nielsen (Antje Traue), a bisavó de Mikkel; e, dessa íntima ligação, ambas famílias Nielsen e Kahnwald descendem. Enquanto isso, no decorrer da narrativa, os pais de Charlotte são, finalmente, revelados por Noah; ele e a própria filha da policial, Elizabeth (Carlotta von Falkenhayn), são seus progenitores. Dessa forma, o paradoxo temporal é mais uma vez abordado pela trama – já que Elizabeth é, simultaneamente, filha e mãe de Charlotte.

Confuso, sim? Mas, por incrível que pareça, Dark flui muito bem. A relação entre os personagens é, inclusive, um dos pontos mais simples da série. Apesar de tudo soar complexo demais, ao longo dos episódios, a associação de cada familiar com os demais é plenamente compreensível.*

*Todos os episódios de Dark estão disponíveis na Netflix.

Ficha técnica

Criação: Baran bo Odar, Jantje Friese

País: Alemanha

Ano: 2019

Elenco: Louis Hofmann, Oliver Masucci, Jördis Triebel, Maja Schöne

Gênero: Suspense, Ficção científica, Drama

Distribuição: Netflix

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