De Tanto Olhar o Céu Gastei Meus Olhos

Indicado na categoria Melhor Curta de Ficção do Grande Prêmio de Cinema Brasileiro 2018, De Tanto Olhar o Céu Gastei Meus Olhos trata da ausência paterna na vida dos irmãos Luana (Maria Eny) e Wagner (Edilson Silva).

Após anos de abandono, os dois, agora adultos,  recebem uma carta do pai que se diz interessado em uma reaproximação. Wagner acredita que o pai possa ter mudado. Luana se recusa a restabelecer qualquer tipo de contato.

O curta dialoga com a lamentável realidade de milhares de crianças brasileiras que crescem sem a presença do pai, dependendo exclusivamente do apoio materno. No final de junho, ainda em clima de Copa do Mundo, o El País Brasil publicou uma reportagem que chamava a atenção para o fato de que seis dos 11 titulares da seleção cresceram sem o suporte do pai biológico.

De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgados pela matéria, 40% dos lares brasileiros são chefiados por mulheres, sendo que aproximadamente 12 milhões delas não têm cônjuges para ajudar na criação dos filhos.

‘De Tanto Olhar o Céu Gastei Meus Olhos’ / Divulgação

Em De Tanto Olhar o Céu Gastei Meus Olhos a diretora Nathália Tereza propõe um olhar delicado e intimista sobre duas pessoas que construíram suas vidas contando somente com a mãe e que, diante do contato do pai, lidam de maneiras distintas com seus sentimentos.

Luana já é mãe (também uma mãe solo). Ela se recusa a remexer o passado de abandono e prefere seguir sua vida. Wagner, por outro lado, fica mexido com a possibilidade de reatar laços com uma figura que parece ter lhe feito muita falta.

Apesar das diferentes reações à tentativa de contato do pai, os dois demonstram, cada um à sua maneira, sentimentos que há muito tempo foram reprimidos. A carta, de certa forma, faz com que os irmãos revisitem um período difícil de suas vidas: o convívio com o alcoolismo do pai e até prováveis comportamentos violentos dele.

O canto de pneu da moto de Wagner no asfalto simboliza o grito de frustração entalado em sua garganta por anos, o aflorar  das mágoas, da revolta e das perguntas sem respostas de um homem que não teve a presença do pai ao decorrer da vida, mas que agora representa a figura paterna para o sobrinho.

Para Luana resta o bloqueio emocional, a vontade de evitar o que um dia machucou. Tal como sua mãe, a personagem encara uma maternidade solo e compreende os dois lados destinados às mulheres abandonadas pela irresponsabilidade masculina: ela é filha e mãe.

A narrativa de Nathália Tereza é engrandecida pela trilha sonora que compõe e revela as paisagens do Mato Grosso do Sul, enquanto a montagem objetiva se contrapõe às emoções contidas transmitidas pela dupla de atores protagonistas.

Com poucos diálogos e muitos olhares comunicando sufocados pesares, a diretora e roteirista explora, num excelente filme, a natureza profunda daquilo que não é dito, nos oferecendo uma obra atual, sensível e madura.

 

Clique aqui para assistir ao curta.

Leia também: “A Passagem do Cometa: o aborto no cinema fantástico de Juliana Rojas”.

 

Ficha técnica

Direção: Nathália Tereza

Duração: 25 min

País: Brasil

Ano: 2017

Elenco: Maria Eny, Edilson Silva

Gênero: Drama

Disponível em: Porta Curtas

 

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