Superlópez é dos super-heróis mais mequetrefes que existem. Ainda bebê ele é enviado à Terra para escapar da ditadura no planeta Chitón. Fruto de experimentos científicos, o garoto é considerado como uma poderosa arma que, no futuro, retornará e libertará Chitón das garras do cruel General Skorba (Ferran Rañé). Mas algo dá errado no trajeto de sua nave e, em vez de chegar aos EUA, a criança poderosa aterrissa na zona rural da Espanha.
No momento do pouso do bebê passava pela estrada o casal Juan (Pedro Casablanc) e Maria (Gracia Olayo), fazendeiros que decidem adotá-lo e chamá-lo de Juan López (Dani Rovira). Com o tempo, os pais adotivos percebem que Juan não é uma criança normal, e justamente por isso optam por ensiná-lo a ser a criança mais normal do mundo. Juan cresce, então, como o estereótipo do cidadão médio, desgostoso com tudo e frustrado por nunca ter podido usar suas habilidades – mesmo sem saber muito sobre elas.
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As coisas mudam um pouco quando o protagonista presencia um acidente de metrô e decide agir. Nesse momento, ele vira assunto no país e chama atenção da vilã Ágata Muller (Maribel Verdú), a filha de Skorba, enviada à Terra para encontrar e destruir Juan, única esperança da resistência de Chitón.
O longa, claramente uma paródia da história de origem de Superman, é dirigido por Javier Ruiz Caldera, roteirizado por Borja Cobeaga e Diego San José (Ocho Apellidos Vascos) e inspirado nas histórias em quadrinho de Jan, um dos quadrinistas mais importantes da Espanha.
As histórias de Jan fizeram parte da infância de muitos espanhóis, e por esse motivo o filme opta por não se basear em nenhuma história específica do artista. Assim, a produção toma uma distância segura para não ofender os fãs mais fervorosos dos quadrinhos, ao mesmo tempo em que garante ter espaço para trabalhar o personagem no audiovisual com mais liberdade, sem abrir mão da linguagem cartunesca, gráfica, colorida e animada.
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Superlópez se dedica a responder a seguinte pergunta: e se Superman sofresse um desvio de rota e fosse criado na Espanha, longe do glamour, idolatria e poder bélico norte-americanos? Bem, de acordo com Jan, os roteiristas e o diretor, ele seria um homem ordinário, antissocial e displicente com o trabalho, mas bastante apegado aos pais.
Juan vive a desventura de precisar torna-se super-herói num país sem tradição; um lugar que o faz passar pelo constrangimento de, com seu uniforme cafona e mal ajustado, ser confundido com artistas de rua que também se vestem como super-heróis para ganhar algum dinheiro dos pedestres.
Juan nem quer tanto assim salvar o mundo ou a humanidade, ele pretende apenas recuperar a normalidade de sua vida, bem como a tranquilidade dos pais, e salvar seu único amigo, Jaime (Julián López) ,e Luisa (Alexandra Jiménez), seu par romântico. Trata-se de um super-herói que mal sabe usar os poderes e que definitivamente não possui os atributos necessários para ser considerado personagem modelo.
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Em Superlópez, Dani Rovira, ator espanhol reconhecido por seus trabalhos em comédias bastante comerciais, atua de maneira mais comedida. Ele equilibra com cautela a mediocridade, as trapalhadas, os fracassos, os afetos e os momentos de quase glória de López. Já Maribel Verdú entrega uma vilã unidimensional, tão chacota e perdida quanto o mocinho. Juntos, eles formam um par e tanto no quesito adversidades do destino.
Como comédia, o longa é bastante funcional e arranca boas risadas graças ao seu teor absurdo e de autodeboche. Não faltam elementos para insinuar que a debilitada autoestima de Superlópez represente a autoestima espanhola frente às potências culturais e econômicas mundiais. O longa chega até a “piratear” referências da cultura pop norte-americana para delinear a inferioridade do universo de seu próprio protagonista – como o exército da vilã Ágata, que lembra os stormtroopers de Star Wars, ou seu robô de destruição massiva, que mais parece um megazord recém saído de um ferro velho.
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Apesar de Superlópez se sair muito bem nos aspectos técnicos, principalmente em relação aos efeitos especiais, as cenas de ação acontecem um tanto quanto fora de ritmo. Descompassada, a montagem perde a chance de dar fluidez à correria e confusão. De qualquer maneira, os personagens são eficientes em aproveitar esse tipo de cena como fonte de nutrição extra para fortalecer a comédia feita de presepadas.
Ao final, o filme demonstra ser um pastelão bem intencionado. Divertido, carismático e até crítico. A inspiração nos quadrinhos com certeza garante personalidade e charme ao filme, que soube usar a seu favor tanto a origem do protagonista em outro tipo de mídia quanto a habilidade de Dani Rovira nas comédias, além do contexto cultural e cinematográfico da Espanha. Mais um ponto para o bom entretenimento espanhol.
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Ficha técnica
Direção: Javier Ruiz Caldera
Duração: 1h47
País: Espanha
Ano: 2018
Elenco: Dani Rovira, Maribel Verdú, Alexandra Jiménez, Julián López
Gênero: Comédia
Distribuição: Netflix
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