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[Estreia] Com Karine Teles, Benzinho é um dos melhores filmes nacionais do ano
Se você assistiu ao ótimo Que Horas Ela Volta? (2015), de Anna Muylaert, com certeza se lembrará de Bárbara (Karine Teles) – a patroa hipócrita e elitista da protagonista Val (Regina Casé). Agora, visualize a personagem de Casé sendo interpretada por, ninguém menos que, Karine Teles. Difícil, não é? A atuação excelente de Teles no longa-metragem de Muylaert consagrou a atriz dentro do cenário audiovisual brasileiro.
Desta vez, Teles retorna em um papel de bastante destaque, na pele de uma personagem que é o oposto da cruel Bárbara. Em Benzinho, que estreou nesta quinta (23) nos cinemas, a protagonista é Irene – uma mulher comum, e que rouba completamente a cena. Mãe do adolescente Fernando (Konstantinos Sarris), do menino Rodrigo (Luan Teles) e do par de gêmeos caçulas, Fabiano (Arthur Teles Pizzi) e Matheus (Francisco Teles Pizzi), Irene é doce e extremamente forte; tendo sempre de segurar a barra que é educar quatro meninos.
No filme de Gustavo Pizzi, quando Fernando, o filho mais velho, é convidado para jogar handebol na Alemanha, a vida de Irene vira de cabeça para baixo. Afinal, isso significa não somente que os pais terão de cobrir todos os custos da viagem, como também que uma mãe terá de deixar o filho adolescente ir embora de casa. Assim, a família, da qual também fazem parte o pai Klaus (Otávio Müller) e a tia Sônia (Adriana Esteves), tem de repensar as finanças e toda a dinâmica espacial.
Por falar em filhos, e caso você não tenha prestado atenção no sobrenome de alguns dos atores, Arthur e Francisco, os gêmeos da produção, são filhos biológicos da estrela e do diretor do filme; que, aliás, também dividiram um casamento e a escrita do roteiro. Quanto a Luan Teles, que interpreta o filho do meio, este é sobrinho de Karine (Teles).
Sobre – e feito em – família, o plano inicial de Pizzi (diretor) não era o de trazer seus parentes para a frente das câmeras. No entanto, a insistência de Luan e, posteriormente, de seus filhos, forçou o diretor a admitir o talento do trio mirim. “Foi um processo longo de ensaios. Eu era o primeiro a dizer não, ‘não vamos botar os nossos parentes porque…não dá. Tem que ser muito bom para estar lá.’ E, aí, a gente foi vendo que, realmente, eles eram as melhores opções para esse filme”, conta o diretor, em coletiva de imprensa em São Paulo.
“Uma das coisas mais importantes desse resultado [da escalação de elenco] foi a preparação [dos atores] que aconteceu. Primeiro, claro, a gente convidou, e teve a honra e a alegria absurda de o Otávio (Müller) e a Adriana (Esteves) aceitarem; que são atores gigantescos”, relembra (Karine) Teles. Por mais brilhantes que todas as atuações sejam, a Irene de Teles é o grande destaque da produção. Os momentos de fragilidade ou de força da protagonista demonstram muito bem a potência que a atriz – emergente – carrega.
Por vezes, é comum nos depararmos com o seguinte pensamento: “agora eu entendo a minha mãe”. Alguns sentimentos de Irene, por mais reprimidos e incorretos que sejam, são totalmente compreensíveis. Aquela mulher, mãe de quatro filhos, e que dedicou a vida a criá-los com muito amor e carinho, se vê sem norte quando descobre que o primogênito irá partir. “Eu não vou voltar”, Fernando faz questão de frisar à família. E, juntamente com Irene, nossos corações se partem com a possibilidade de separação definitiva.
O trabalho de som em Benzinho atua como uma espécie de facilitador entre o público e a história. Isso significa que, tudo aquilo que não é dito em palavras, principalmente pela personagem de Teles, fica exposto pela combinação entre seus olhares e o som ambiente da casa – uma locação em Petrópolis (RJ).
“Além da coisa técnica, é uma coisa narrativa de como contar essa história. O som conta muito essa história. Desde o roteiro, a gente já sabia que, em alguns momentos, teria uma coisa [que iria] mais para um lado [focado na sonoridade]”, revela Pizzi. No que Teles complementa, “eu acho que, agora, a gente está começando a ver mais, nos filmes brasileiros, esse som mais ‘sujo’. Porque o som da televisão é um som limpíssimo. As pessoas estão em uma boate, dançando, e você escuta tudo o que elas falam normalmente. E, se vocês prestarem atenção, aqui [em Benzinho], o som é muito redondo”.
De fato, é evidente que cada detalhe da construção sonora foi muito bem pensado. Benzinho parece ser um filme sem falhas, tanto na parte técnica quanto na artística. A universalidade de sua trama conquistou públicos em diversos países ao redor do mundo, como no Festival de Sundance, em Utah (EUA). Assim, Pizzi e Teles consagram-se como nomes de peso no cinema nacional.
Ficha técnica
Direção: Gustavo Pizzi
Duração: 1h35
País: Brasil
Ano: 2018
Elenco: Karine Teles, Otávio Müller, Adriana Esteves, Konstantinos Sarris
Gênero: Drama
Distribuição: Vitrine Filmes
Crítica: Duas de Mim
Não é de hoje que os filmes comerciais de comédia nacional têm fama de carregar multidões aos cinemas, mas isso começou a variar de acordo com o contexto sociocultural do momento. Em 2015, Loucas Pra Casar foi o filme nacional de maior bilheteria. Já em 2016, o polêmico e religioso Os Dez Mandamentos ficou em primeiro lugar. Agora, em 2017, Polícia Federal – A Lei é Para Todos fez grandes números, vendendo mais de 400 mil ingressos no primeiro fim de semana.
Tais números, que demonstram a preferência do público geral por filmes nacionais com conteúdos problemáticos – como piadas preconceituosas, estereótipos machistas e temáticas das religiões dominantes – são um reflexo da manifestação do conservadorismo em nosso país, que não é recente, mas que avança.
Ainda que filmes religiosos e politicamente conservadores tenham fincado seu lugar no cinema nacional, as comédias são sempre lançadas com alguma frequência e apresentam números bastante expressivos. Duas de Mim é um desses casos. Sua estreia no dia 28 de setembro rendeu mais de 80 mil ingressos vendidos no primeiro fim de semana.
Com direção de Cininha de Paula – experiente em produções televisivas da Rede Globo, como Escolinha do Professor Raimundo, Sai de Baixo e Pé na Cova – seu novo filme se propõe a retratar, de forma divertida, a vida de Suryellen (Thalita Carauta), uma mulher que vende marmitas pela manhã, trabalha lavando louça para um restaurante à noite e mantém sozinha o filho, a mãe (Maria Gladys) e a irmã mais nova (Letícia Lima), representando, assim, a dura rotina de muitas mulheres brasileiras.
Até certo ponto, tratar dos problemas do dia a dia e dos sonhos que uma mulher não consegue realizar – porque a sociedade não permite – de forma engraçada, parece ser uma proposta com muito potencial. Até mesmo o humor contido no fato de o cantor Latino interpretar um cover de si próprio chega a funcionar. No entanto, quando a protagonista come um “bolo dos desejos” e pede para se dividir em duas, as coisas começam a desandar. Isso acontece não apenas na qualidade do filme em si, mas atrapalha também a mensagem que ele poderia transmitir aos espectadores.
Quando a outra Suryellen surge, idêntica fisicamente, mas com uma personalidade completamente diferente da original, poderia ter surgido também uma demonstração de solidariedade da duplicata para com aquela mulher que tinha uma vida tão atribulada. Inicialmente, isso até acontece, mas a clone da protagonista logo se transforma no clichê da vilã que precisa ser derrotada, e qualquer chance de falar sobre sororidade – o apoio mútuo entre mulheres –, em uma comédia que conversa com milhares de pessoas, vai direto para o buraco.
A partir daí, diversos clichês de baixa qualidade são simplesmente jogados no filme; como a vilã louca que quer tomar o lugar de outra mulher, o machismo textual reproduzido em várias cenas, a mulher rica que não trabalha e só quer glamour e as piadas inaceitáveis com anões, em pleno 2017. Tudo isso para terminar com o Latino cantando algo chamado por ele de “reggaeton abrasileirado”, mas que de reggaeton não tem nada.
Duas de Mim poderia ser uma aposta interessante na mudança de rumo das comédias nacionais escrachadas. Em determinados momentos, algumas mensagens importantes até conseguem ser lançadas, mas, infelizmente, não é um filme que entrega o potencial que aparentava ter. Trata-se de mais uma comédia que tenta flertar com pautas que estão em alta no momento, mas que por vezes se perde no pior do humor conservador.
*Texto originalmente publicado em 12/10/2017
**Dados sobre bilheterias foram retirados do site AdoroCinema
Ficha técnica
Ano: 2017
Duração: 1h22
Direção: Cininha de Paula
Elenco: Thalita Carauta, Latino, Letícia Lima, Márcio Garcia
Distribuidora: Paris Filmes
País: Brasil