Lançado diretamente nas plataformas digitais, o documentário Indianara, da francesa Aude Chevalier-Beaumel e do brasileiro Marcelo Barbosa, acompanha dois anos da vida da ativista transexual Indianara Siqueira, fundadora da Casa Nem, abrigo para pessoas LGBTIs em situação de vulnerabilidade social no Rio de Janeiro.
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Sem realizar entrevistas formais diante das câmeras, os diretores se dedicam a ser observadores atentos dos pormenores do cotidiano de Indianara. Logo, tendo sido gravado entre as manifestações pelo Fora Temer, em 2016, e a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, o filme entrelaça a militância política da protagonista nas ruas com sua privacidade, dentro de casa, junto ao marido, e os desafios da administração da Casa Nem.
Imersivo e rico em material, Indianara extrapola a simples apresentação de alguém em destaque no cenário das lutas sociais ao dar conta de contextualizar a intimidade dessa figura narrativamente central com a complexidade das movimentações do Brasil dos últimos anos.
MULHER E ATIVISTA
Nome importante da resistência urbana no país que mais assassina travestis e transexuais no mundo, Indianara Siqueira transita pelas margens das margens, lutando pelos direitos das mulheres, das prostitutas e dos LGBTIs há décadas.
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Invariavelmente, seu corpo e sua mente sofrem os efeitos de anos de liderança combativa. O desgaste causado pelo enfrentamento direto da intolerância, dos poderes hegemônicos e das mais diversas manifestações de violência, além das disputas intrapartidárias e de sua constante proximidade com a morte, são perceptíveis em tela.
Mais do que ativista, afinal, Indianara é uma mulher; com fragilidades, dúvidas, contradições, qualidades e personalidade própria. E embora mostre-se cansada, seu espírito revolucionário nem de longe aparenta estar vencido. Ainda enérgica, Indianara se entrega agora, com mais afinco, ao trabalho de formação política de novas gerações de militantes comprometidos – com atenção especial às pessoas acolhidas pela Casa Nem.
MARIELLE FRANCO
O assassinato político de Marielle Franco é ponto-chave tanto para o desenrolar do documentário como para a vida da protagonista. Braço de apoio de Indianara no legislativo, a vereadora foi morta no início de 2018. Desde então, Indianara vive sob protocolos de segurança, com medo de ser uma possível próxima vítima.
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Aos 50 anos e sem poder baixar a guarda em um país cada vez mais hostil à diversidade e aos valores que defende, Indianara Siqueira protagoniza uma das grandes estreias nacionais de 2020.
No futuro, quando perguntarem o que acontecia no Brasil pós-impeachment de Dilma Rousseff, o recorte feito por Chevalier-Beaumel e Barbosa poderá ser usado como resposta de grande relevância.
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Trailer:
Ficha Técnica:
Direção: Aude Chevalier-Beaumel, Marcelo Barbosa
Duração: 1h23
País: Brasil
Ano: 2020
Gênero: Documentário
Distribuição: O2 Play Filmes
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