Três Verões: notas sobre o classismo brasileiro

Todo ano, Edgar (Otávio Muller) e Marta (Gisele Fróes) recebem família e amigos para as festas de Natal e Réveillon em sua mansão de luxo à beira-mar. Compete a Madá (Regina Casé), caseira da propriedade, organizar tudo para acomodar patrões e convidados, gerindo os empregados e garantindo que a semana de comemorações saia como o planejado. Quando Edgar é preso numa investigação de corrupção da Polícia Federal, porém, as boas aparências da rotina da tradicional família burguesa brasileira entram em processo de desmantelamento. 

‘Três Verões”/ Divulgação

Ambientado entre 2015 e 2017 e dirigido por Sandra Kogut, o longa-metragem Três Verões se dedica a acompanhar a decadência pública de uma família rica a partir da perspectiva de seus empregados, sempre através do que acontece na casa de verão durante a última semana de cada ano. Dividido em três atos, portanto, o filme dá conta do antes, do durante e do depois da prisão de Edgar na vida dos subordinados.

BASTIDORES

Quem de fato paga o pato da corrupção no Brasil? Criado na esteira dos noticiários sobre a Operação Lava Jato, Três Verões pretende abordar como os escândalos de corrupção que tomaram de assalto a grande mídia afetam a vida de gente comum, gente invisível às manchetes.

Dos bastidores, Madá e os colegas assistem aos desdobramentos da situação dos patrões. Primeiro, confusos. Mais tarde, preocupados sobre a casa abandonada e o destino de seus empregos. Da mesma forma, o pai de Edgar (Rogério Fróes), um professor aposentado, é deixado de escanteio pela família quando a vida do filho se complica.

Imagem: divulgação

Flertando com um humor desconcertante, digno dos climões sociais cafonas do país, o roteiro, também de Kogut e escrito em parceria com Iana Cossoy Paro, não se atém a detalhar características muito elaboradas das personalidades de seus personagens. Em vez disso, aposta-se em um grupo de empregados que não têm muita opinião a dar sobre o que estão experienciando de perto. A eles cabe apenas se virar enquanto as contas da família estão bloqueadas e seus salários atrasados.

Nesse sentido, e a despeito das atuações competentes do elenco e da premissa instigante de retrato sobre o Brasil recente, o filme não avança para além de breves notas sobre o classismo e os jeitinhos brasileiros. Como resultado, vemos em tela somente a reprodução de tipos sociais: “os empregados”,  “os patrões”, “a polícia”, “o pai decepcionado com o filho corrupto”, etc.

DE REPENTE, MELODRAMA

Ao longo dos três verões do título, a produção de Kogut traça uma linha temporal e episódica dos fatos que afetam todos os núcleos de personagens, conectando-os ao contexto macro da sociedade brasileira. Do meio para o final do filme, no entanto, o roteiro decide adotar saídas emocionais para chegar à conclusão da narrativa. O problema é que, contando com personagens de poucas nuances, as cenas sentimentais não convencem.

Logo, a obra que prometia fazer as vezes de “ o outro lado das manchetes” se afasta de sua própria premissa, abrindo mão de qualquer valor de crítica ou profundidade em favor de “momentos novela” despropositados. 

Sem nada de realmente substancial para discutir sobre o Brasil que pretendeu espelhar, Três Verões desperta o interesse do espectador por seu formato, mas acaba limitando-se às camadas mais superficiais de tudo o que poderia ter sido.

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Trailer:
(Fonte: Vitrine Filmes/ YouTube)

Ficha Técnica:

Direção: Sandra Kogut

Duração: 1h34

País: Brasil

Ano: 2020

Elenco: Regina Casé, Rogério Fróes, Otávio Müller, Gisele Fróes, Jéssica Ellen, Daniel Rangel

Gênero: Drama

Distribuição: Vitrine Filmes

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